quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

É claro, porque não?


Eu considero a primavera como a estação mais bonita que há. Faz-me aproveitar mais o dia, sair de casa, ler mais livros, sentir o cheiro das flores que tanto me fascina e socializar mais. E foi o que eu resolvi fazer hoje: sair de casa.

Levantei, lavei meu rosto, escovei os dentes, fui comer meu cereal com leite. O de sempre, nada muito novo. Tomei um banho rápido, peguei o livro que eu estava lendo e saí sem compromisso, apenas para admirar a paisagem que se forma nessa época e ver pessoas andando com suas roupas floridas por aí. Cheguei numa pequena praça que há na cidade, me sentei no banco de um modo confortável e me prostei a ler. O livro estava me entretendo, mas não a ponto de me fazer não olhar para as sorridentes pessoas que passavam em minha frente.

— Eu posso me sentar ao teu lado? — ouvi uma voz avelulada, meiga e singela dizer. Um arrepio percorreu o meu corpo chegando à minha face e me fazendo acordar para a realidade. Levantei o meu rosto e a encarei.
— É claro, porque não? — dei o meu melhor sorriso. Não que eu tenha um sorriso bonito, mas particularmente é a característica que mais atrai as pessoas.
— Obrigada. — disse meio envergonhada. Observei-a sentar-se, arrumar sua saia e colocar o cabelo atrás da orelha. Estava querendo um pouco de paz e calma para ler, assim como eu.

Não proferimos mais nenhuma palavra, mas apenas ter a companhia dela ao meu lado me causava uma sensação boa, tão boa que chega a ser indescritível. Na verdade indescritível mesmo é uma simples pessoa sentar ao meu lado e emanar sentimentos bons. Isso é raro hoje em dia.

No impulso, convidei-a para tomar um café na minha lanchonete preferida que era logo ali. Lugar para gente conhecida e que também quer silêncio, nada mais que murmurinhos e interação entre leitores. Por incrível que pareça ela não hesitou e disse sim. Acho que foi pelo impulso. Fechei meu livro e fui guiando-a até o lugar.

Chegado ao nosso destino, escolhi a minha mesa habitual e comecei a papear com ela. Pedi meu café forte e ela pediu o mesmo. Contou da rotina dela, dos amigos, dos pais e da freqüência que ela vinha na cidade. É, o que é bom é impossível demais para mim. Ela não morava aqui e estava apenas de passagem. Enquanto contava sobre a vida dela eu observava a maneira doce de como os lábios dela se mexiam, de como os cílios pretos e grandes batiam contra a parte inferior do olho e voltavam. O sorriso de lado que ela fazia me impressionava.

Tentei dar o melhor do meu charme até a hora de nos despedirmos. Levei-a até o ponto e esperei um táxi chegar. Aproveitei para entregar o livro que eu estava lendo caso não nos vêssemos mais e ela fez o mesmo. Mas por estranho que isso possa parecer eu tinha a leve impressão de que iríamos nos ver no outro dia por coincidência, no mesmo local.

Fui para casa saltitante. Há tempos não sentia algo como isso. Dormi pensando nela e acordei cedo na intenção de ir pro local em que nos encontramos. A imagem dos cabelos ruivos cacheados e brilhantes dela batendo contra as costas não saiu da minha mente. O cheiro também era maravilhoso e eu tenho certeza que era o cheiro da pele, não de um perfume qualquer. Ela era realmente especial, ou talvez eu apenas tenha preferido ver o que há de especial nela, não ignorado.

Levantei-me, fiz o mesmo do dia passado e fui. Com o livro dela, agora, começando a ler as primeiras páginas e rindo das anotações bobas que ela fez em alguns capítulos. Além de linda é engraçada. Sentei-me no banco e esperei. Esperar não é algo que me agrada, mas a cada minuto que se passava a ansiedade aumentava.

Aumentou a toa. Esperei até à noite e nada. Olhei para as pessoas que já não estavam tão sorridentes mais e nem as flores tinham a beleza de ontem. Talvez seja o meu mau humor piorando as coisas. Ansiei demais por algo que eu devia ter suposto que não iria acontecer. Mas não vê-la novamente não foi motivo para tirá-la da minha mente. Todos os dias em que vou nessa praça me lembro do modo como ela me abordou e de como me fez rir na lanchonete. E as chances de vê-la novamente não eram tão ínfimas assim. Talvez ela pudesse voltar qualquer dia desses e me encontrar na mesma praça, com o livro dela, toda envergonhada, disposta a tomar um café e, quem sabe, até mesmo comer alguns biscoitos. É claro, porque não?

9 comentários:

  1. Aqui está a prova de que você tem talento. Assim como tem capacidade para escrever um texto sombrio, ou provocante, você sabe escrever algo romântico. Me surpreendeu.

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  2. Caralho, todos os seus textos serão sempre perfeitos assim?
    Chego a me imaginar daqui uns anos, entrando na livraria pra compar um livro seu.

    Você me surpreende a cada parágrafo.

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  3. Que maravilha de texto. A sua sensibilidade encanta.

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  4. Eu fiquei sem palavras, e exagerando um pouquinho, sem fôlego. A cada palavra que você escreve que entra na minha mente, eu te admiro ainda mais. E pode ter certeza de que pelo menos uma fã você já tem.

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  5. totalmente diferente dos demais, porém com a mesma intensidade e perfeição, me encantando novamente.

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  6. não tenho muito a dizer, só que achei o texto lindo e o seu talento incrível

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  7. Nossa! Maravilhoso esse texto!
    Meus parabéns!

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  8. todos os seus textos são incríveis!
    independente do tipo de tema que você aborda ou o tipo do texto você surpreende com o seu talento.
    parabéns, todos os textos do seu blog me toca de uma forma de diferente e me faz gostar de ler mais e mais o que você escreve

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