domingo, 19 de dezembro de 2010
Biscoitos para a Saudade.
Três toques na porta. Não foram combinados ou algo assim, ela simplesmente prefere bater três vezes antes de vir me perturbar. Eu sentia que ela estava a caminho. Sempre atraente, delirante, me hipnotizando e me fazendo convidá-la para uma pequena conversa. Abri a porta e ela veio como um furacão.
Dessa vez ela foi rápida. Entrou, se sentou e me olhou nos olhos. Eu simplesmente não sabia o que dizer. A Saudade nunca foi uma pessoa fácil de lidar. Não sabia se ela existia para me fazer querer as coisas que perdi de volta ou se era apenas para deixá-las lá, no passado. Pegou alguns biscoitos do pote em cima da mesa, começou a comê-los e a falar do passado.
— Você se lembra, não lembra? De como você foi feliz? De quantas pessoas você tinha ao seu redor e de como era maravilhoso aquele seu poder de melhorar qualquer situação? Onde foi parar aquilo tudo, hein? O que é que você fez de você? — a Saudade disse friamente, dando uma risada sarcástica no final, voltando a me fitar nos olhos, continuando: — Tantos amores você perdeu, tantas oportunidades você deixou passar... Até parece que eu gosto de te acompanhar por onde você vai. Às vezes me cansa, realmente me cansa ter que ficar te lembrando de como você era especial, de como você brilhava até mesmo sem ninguém. Eu te admirava. Evitava aparecer para não atrapalhar a luz que te rodeava. Hoje? O que é que você é hoje? Perde teu tempo com coisas fúteis, logo você que odiava essas superficialidades. Eu juro que se esse seu orgulho e esse seu comodismo não fossem tão fortes, eu te levaria de volta ao passado. Ou pelo menos tentaria. Mas você escolheu assim.
Ela me conhecia tão perfeitamente bem que dizia coisas intensas, profundas. Fazia-me realmente voltar ao passado, mas somente em pensamentos. O mais admirável é que ela conseguia aparecer de todos os modos: em cheiros, em roupas, em fotos, e até mesmo em músicas. Ela me enchia com toda a sua plenitude e logo em seguida saía, deixando um vazio imenso, aquele gosto de nostalgia que eu sabia que não iria me livrar tão cedo.
E nessa solidão acompanhada de sobriedade e biscoitos, vou sendo acompanhado pela Saudade; esse sentimento que não sabe se vai ou se volta; não sabe se me faz parar ou me faz voltar. Talvez tenha que ser assim. Talvez eu tenha que continuar a ser a coisa monótona que a Saudade carrega em sua mala. Frustrações me deixaram assim, ela deveria tentar me compreender.
Mas a Saudade? Compreensível? Não. Ela apenas vem e vai, inúmeras vezes. Deixando rastros, pegadas, todas as evidências possíveis. Deixando sempre o gostinho especial da Saudade.
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Não precisarei mais buscar a definição da Saudade. Fez minha alma entender e até mesmo enxergá-la.
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ResponderExcluirA saudade é a bengala do velhinho que mora dentro de mim...
ResponderExcluirTu escreve muito bem, até já te disse isso.. Sério, até fico com vergonha do que escrevo quando leio seus textos, tu é foda.
ResponderExcluirA Saudade é mesmo muito marota. Vive dizendo para tentarmos trazer o passado para o presente, mas ela não nos diz que á não é a mesma coisa.
ResponderExcluirÓtimo texto, Brenda, personificar os sentimentos traz toda uma fluidez e lirismo ao texto.
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